O balão vermelho

Começamos a contagem regressiva uma semana antes do encontro. Muitas coisas aconteceram naquela semana, inclusive a entrada de um balão nas conversas.
Falavamos na verdade do gosto peculiar que ele tinha de ser assoprado na boca. O desenho do singelo balão vermelho acabou ganhando nova conotação e se tornou referência da esperança em nosso reencontro.
Ele, de sentir paz com a minha presença.
Eu, de encontrar as respostas que procurei por anos.
Então a cada dia, na hora da despedida de boa noite, digitávamos o dia a menos na contagem e mandávamos o balão como um selo de carta.

Eu pensei muitas coisas aquela semana, ainda nem consigo reorganizar. Mas uma das coisas que ele me falou caiu pesada no meu colo: "eu penso na gente e parece que faz tanto tempo já." De fato, fazia.
Mas eu precisava pagar pra ver. A cada ano e a cada novo momento eu carregava aquele nosso amor caído, o balão que ficou amarrado no meu braço pra que eu não o perdesse pelos parques da vida, mas agora já murcho. E eu não sabia bem o que fazer com aquele peso morto, que de alguma forma ficava entre mim e um novo abraço.
Até que voltamos a nos falar como antes.
E recebi o Eu te amo que esperei por tantos anos.
Falamos tantas coisas que voltei a sorrir sem motivo, pensando nas tantas coisas boas que sentimos. Foi um grande sopro de ar nos nossos balões.
Um ou dois dias antes do encontro tive uma crise. Me senti febril, com coração acelerado, calafrios e sem saber se caia em choro ou riso. Me reprogramei para parar de pensar. E dali em diante deixei de usar as emoções do passado como base para o encontro vindouro.

Foi a primeira vez dentre muitos dos nossos encontros que não tive medo de ele não aparecer. Achei que fosse porque ele precisava disso mais do que eu, mas podia ser indício de que meu vínculo estava se rompendo.
Quando eu o avistei encostando o carro, tive um grande choque: me senti voltando no tempo. Foi uma sensação inesperada e tão difícil de lidar que me desconectei em parte do momento. Pra mim, não dava mais, eu entendi.

Ele teve a paz que queria ao meu lado.
Eu tive as respostas que procurava.
Estavamos quites.

E na hora da despedida de boa noite, agora com o cronômetro zerado, ele me perguntou:
"Que horas nos vemos na segunda?"
Eu engoli seco.
"Bem... acho melhor não nos vermos" e o abracei para disfarçar as lágrimas que vinham sem escolha.
"Eu sei que não dá mais... e preciso seguir em frente de verdade".

E ali naquele abraço molhado sob o sol que acordava, soltei meu balão para ser livre no céu azul que abria.

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