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Mostrando postagens de outubro, 2010

Cubo Mágico parte II

- Eu queria saber brincar até completar. Dizem que depois dos lados completos você consegue descobrir o que tem dentro - falou Aninha baixinho. - Então por que não tenta? - Porque eu não consigo. - Ah, você já tentou muito? - Não, nunca tentei. Mas minha prima sempre diz que esse tipo de coisa é inteligente demais pra mim. Se ela me visse com esse cubo na mão já teria feito pouco caso. - Então aproveita que ela não tá vendo e tenta - sorri e pisquei um olho. Foi com esse gesto que eu ganhei o primeiro sorriso de Aninha, que me inundou como uma grande onda. Senti que dentro daquele corpo, que tentava passar despercebido pelos outros, havia alguém maravilhoso e fiquei feliz. Nesse tempo o sol começou a sumir e eu tirei os óculos para admirar. - Acho fantástico como o sol sai tingindo o céu de rosa, enquanto a lua vem pintando ele de azul. Eu devo mesmo amar esse momento pois nunca me canso de vê-lo, onde quer que eu esteja - falei. Aninha levantou os olhos do brinquedo e fez a mes

Cubo Mágico parte I

Todos os dias ela cumpria a mesma rotina e nos finais de semana passeava pelos mesmos lugares. Gostava de ir com sua prima a um parque do lado da casa dela. Um parque de árvores e plantinhas e patinhos e laguinhos. Aninha - como o próprio apelido representa - era acostumada a adjetivar as coisas no diminutivo. E levar assim, uma vidinha. Um fim de semana desses a prima dela viajou e ela foi ao parque sozinha. Foi bem nesse dia que eu conheci Aninha. De cabelo trançado, short jeans desfiado, uma camisa de botão discretamente florida e havaianas preta, tinha cara de quem está matando aula. Eu havia estendido minha canga na grama e de óculos escuros, lia um livro esperando o pôr-do-sol. Esse ponto florido entrou então no meu raio de visão por detrás do livro e fiquei observando-a, intrigada com sua cara de desilusão. Enquanto me distraí, minha folha marca-página (com costumeiras e inúteis anotações) voou até a beirada do parquinho de areia por onde Aninha vinha atravessando. Me apressei

Tatuagem

"Revelar a tatuagem é revelar o que, no corpo, esconde-se mais do que o próprio corpo, com o propósito, entretanto, de se revelar." Francisco Bosco - Tattoo You, do livro Banalogias. [Em: http://docedelira.blogspot.com/#ixzz0uumwJEL9 ] O dia que eu decidi que queria fazer uma tatuagem sabia que significava uma mudança pra sempre. Não que eu fosse mudar para sempre depois dela, mas pelo contrário, que eu já tinha mudado e exatamente por isso cheguei a tal escolha. Antes, achava interessante os desenhos riscados nos outros e me perguntava como tinha sido essa experiência para aquela pessoa. Tatuagem me deixa curiosa. Com o tempo notei que carregar uma marca escolhida no corpo era escolher carregar uma história, só que de dentro pra fora. Era oferecer para quem visse, o desejo de conhecer um pouco de algo maior. História mesmo. Porque mesmo que tenha gente que cometa erros marcados no corpo, quem leva consigo um desenho desses geralmente leva um pedaço de passado. Ou de o

Forever Young

Pisei na grama do quintal de casa. Também é noite e o vento está um pouco frio, o céu cinza escuro e sem estrelas, dizendo que vai chover. Logo senti uma chuvinha fina e leve encostar na minha pele. Ouvi o barulho que o chinelo fez sobre os matinhos que crescem na beirada da garagem e voltei mais de um mês na memória. Quando olhei de novo pro quintal vi um homem-moleque vestido de gente grande virando cambalhota enquanto uma mulher-menina toda produzida tirava seu peep-toe de salto alto e largava em cima deles os brincos brilhantes e pesados, só pra brincar de fazer contrapeso de corpos. Depois, foi um pulo nas costas, um abraço no pescoço e o sabor da saudade fria doendo, mas conseguindo escorrer entre eles. Quem se importa que horas são, se estão no sereno ou vestidos com roupa de festa? Juntos é tudo supérfluo. Juntos, a saudade derrete. Se envelhecer rápido demais for sinônimo de muitas experiências de vida, sei que estou fadada a envelhecer cada dia mais. Primeiro porque não é seg