Mudando a fôrma

Quando o fardo ficou pesado demais, pensei em parar.
Foi uma dor profunda, igual ou maior da que sentia ao andar com o fardo nos ombros.
Doeram meus joelhos, pés, coluna, ossos da saboneteira, cabeça e senti uma fisgada profunda no coração.

Nunca paro. Nunca desisto. Nunca volto atrás.
Mas esses poucos segundos de decisão repentina me tiraram a visão e me perdi do caminho. O fardo pesou de vez e precisei sentar em meio ao nada.
Sabia que estava cheio lá pois ouvia as vozes de muitas pessoas num desarranjo caótico, mas não conseguia vê-las. Pareciam todas tão iguais que não conseguia distinguir nenhuma.
Não queria ficar ali, não queria me misturar àquela multidão sem cara, aos fabricantes de vidro que Gaarder falou. Não quero ser qualquer um, não quero ser só um número, me recuso. Quero ser Curinga.

Faz um tempo que comecei essa aventura em meio ao deserto de rostos iguais e muitos acharam que entrar nesse caos seria a coisa mais difícil que eu tinha pela frente. Que nada. Para alguém como eu, a parte mais difícil vem agora, na hora em que a vida me obriga a parar. E mudar.
Eu nunca paro,
nunca desisto,
nunca volto atrás.
Mas sou jogadora e sei a hora que é preciso ceder para ganhar. Tem um dito popular que diz que para ganharmos um presente melhor precisamos ter as mãos livres para recebê-lo. A vida vem me ensinando isso. Primeiro foi um projeto que não veio. Em troca ganhei outro. Depois abri mão da estabilidade. Em troca ganhei uma oportunidade inimaginável. Agora a vida vai me conduzindo para a mudança mais complicada até então, que é mudar a mim mesma. Não quero mais a mesma pele, o mesmo corte e tom de cabelos, as mesmas roupas ou jeito de andar. Tenho necessidade de me desfazer de cada detalhe que representa quem eu fui nos últimos anos. Estou sedenta por uma vida nova, por novos rumos, novas experiências e novas pessoas, que possuam rostos e personalidades. Descobri que existe esperança em meio ao caos e portanto estou disposta a abrir mão do que mais for necessário.

Estou abandonando a velha fôrma.

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